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Foto: Sammy Williams por Pixabay
Broncas do Rafa – “Não o alimentem com pipoca!”

por Rafael Veloso*

Era uma típica tarde de maio em Salvador. Bastava cair aquela chuvinha fina para ver, nas ruas da capital baiana, o congestionamento de guarda-chuvas e sombrinhas. Motivo para alguns tirarem do armário aquele casaco com cheiro de naftalina, para se protegerem do “frio”. Se é que faz frio nesta cidade.

Apesar de ser usuário do sistema de transportes coletivo – o popular “buzú” – ou mais conhecido como “humilhante”, fui o primeiro a chegar ao local combinado do encontro. Deveríamos realizar um trabalho de faculdade. Não seria nada complicado ou demorado. Entrevistaríamos um repórter do jornal A Tarde.

Aos poucos foram chegando os membros da “patota”, um a um. Eu, “Bia” e “Babinha”. Agora, só faltava esperar a quarta integrante do “grupo dos Minhoquinhas”. De repente, “Liloca” liga para o celular de Babinha e pergunta onde estávamos? “Como assim, onde estávamos? Lá foi ela para a outra entrada. Não prestou a atenção quando disse que era na principal”, pensei eu, já ensaiando o esporro. Que nada! Tive de guardá-lo para uma próxima ocasião. Ela já estava dentro do prédio do jornal, acenando para a gente. Coisas de Liloca!

Fomos recebidos com muita simpatia pelo nosso perfilado e a entrevista corria sem problemas, quando passa pela sala que antecede a redação – onde os visitantes são atendidos -, um jornalista cabeludo, com cara de roqueiro, que verbaliza: “Não o alimentem com pipoca!”. Na hora confesso, que ingenuamente, até pensei que nosso entrevistado gostasse de pipoca doce. Daquelas que vem no saco vermelho. Acho que essa ideia veio conduzida pela fome que estava sentindo no momento ou pelo fato de gostar desse tipo de pipoca.

Finalizado o interrogatório, ele nos acompanha até a portaria. Um papo mais descontraído, motiva Liloca a perguntar o significado da expressão usada por seu colega de trabalho. O pobre jornalista dá um sorriso amarelo e sem jeito, responde explicando que os estudantes de comunicação quando visitam o jornal, cercam os jornalistas e os idolatram como se fossem animais no zoológico em dia de domingo. Mas, como assim?! Cadê o macaquinho e a girafa? E a curiosa não contém o riso, chegando a ficar vermelha.

Essa também vai para os anais da minha vida acadêmica, fazendo companhia com a história da “minhoquinha”. Ah, vocês não conhecem a história da minhoquinha? Então, vamos lá. Podem ficar calmos que serei breve. É sempre bom avisar, antes que um leitor mais afoito desista da leitura.

Havia acabado de ingressar na faculdade de comunicação e após mais uma dessas palestras sobre o futuro da profissão, caminhava até o ponto de ônibus conversando com uma colega de curso, só que do 5° semestre. A conversa girava em torno das dificuldades do estágio em jornalismo. Foi quando ela me disse que estudante do 1° período, como eu, é a terceira pessoa depois do formando. Seguindo esse raciocínio, constatamos que os recém-formados ou os que estão concluindo o curso, são chamados nas redações de “focas”, logo eu, seria uma sardinha. Sardinha, não. Seria a isca da sardinha, ou seja, a fatídica “minhoca”.

E o pior é que o apelido da turma pegou e até a coordenadora do curso, se referia a minha turma de primeiro semestre como a “turma dos minhoquinhas”. Vocês pensam que é fácil essa vida de estudante de jornalismo?

* Texto escrito em 2003.

Broncas do Rafa – Agora é lei?

Ler uma notícia informando sobre o estabelecimento de uma lei municipal vetando o comércio de bebidas alcoólicas para menores de 18 anos, parece um déjà vu. Principalmente, em uma sociedade em que o uso das tais drogas lícitas é comumente aceito, alardeado e publicitado em todos os meios de comunicação, como um item obrigatório na busca da tão almejada felicidade.

Sancionada no mês de setembro pelo prefeito João Henrique, a Lei Municipal 7.107/2006, começará a vigorar a partir do dia 22 de novembro. Todos os bares, restaurantes, casas noturnas e estabelecimentos comerciais de Salvador que forem flagrados vendendo bebidas alcoólicas para menores de 18 anos, ou que não tiverem afixada em local visível, uma placa informando sobre a proibição, serão punidos.

A punição vai de uma simples advertência, passando por multa de R$ 500, dobrada a cada reincidência, suspensão parcial da permissão para venda de bebida alcoólica, e até a cassação do alvará de funcionamento do estabelecimento.

A nova lei, atuará na esfera administrativa, já que a cidade necessitava de uma regulamentação especifica. Na esfera cível, o artigo 81 do Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) proíbe a venda a menores de 18 anos “de substâncias com risco de criar dependência”. A punição criminal é feita até hoje, baseada na Lei de Contravenções Penais, elaborada na década de 40, que prevê detenção de até três meses.

Estatísticas anuais comprovam que o número de acidentes de transito e à violência, maiores causas de morte entre os jovens está intrinsecamente ligada a ingestão do álcool e casos de total embriaguez.

Após a leitura atenta da reportagem publicada no jornal A TARDE, do último domingo (dia 22/10), fica a pergunta: vingará a idéia de uma nova lei proibindo a venda de bebidas alcoólicas, se essa iniciativa não estiver atrelada a uma quebra de paradigmas: Uma mudança radical de postura de todo uma sociedade onde o consumo de bebidas alcoólicas iniciada na adolescência é aceito, estimulado pelos meios de comunicação e até pelas próprias famílias?

Todo mundo sabe que vender bebida alcoólica para menos de idade é crime. A proibição já existe, mas não é respeitada. Como forma de colocar ainda mais a sociedade a favor do novo item da legislação, o governo municipal anuncia que os recursos levantados com as multas aos estabelecimentos que descumprirem a Lei 7.107/2006 serão destinados ao Fundo Municipal dos Direitos da Criança e do Adolescente (FMDCA). Esse fundo que financia projetos educativos para crianças e adolescentes em situação de risco social e pessoal, precisava de doações. Em 2005, por exemplo, dos 23 projetos aprovados, somente três poderam ser financiados.

A fiscalização do cumprimento da lei, agora que já foi aprovada, ficará sobe a responsabilidade das polícias Militar e Civil, em parceria com os Conselhos Tutelares, Juizados de Menores, Prefeitura e Promotoria da Infância e Adolescência do Ministério Público Estadual (MPE).

Esperamos que no país da “Lei do Gerson”, onde a premissa é levar vantagem em tudo, nem que para isso tenha que pisar em alguém, a Lei 7.107/2006 não seja só um número a figurar no papel. Que os donos de bares e estabelecimentos comerciais não fiquem tentados ao lucro fácil, que a mais nova lei seja cumprida a risca e que nossos jovens sejam criados conscientes de seus limites.