Psiquiatra e sociólogo debatem sobre as fronteiras entre terrorismo, fanatismo religioso e transtorno mental
As tênues fronteiras entre terrorismo, fanatismo religioso e transtorno mental foram tema de um instigante debate entre o sociólogo Demétrio Magnoli e o psiquiatra Luiz Fernando Pedroso, na terceira edição do Ciclo de Palestras Holiste realizado na noite dessa terça-feira (dia 22/11), em Salvador. “O ato terrorista é uma tentativa de persuadir uma parte da população de uma certa doutrina política, não apenas de obrigar um governo a fazer ou deixar de fazer uma coisa, como diz a Organização das Nações Unidas em sua definição de terror”, explicou Demétrio Magnoli, para uma atenta plateia que reuniu psiquiatras, psicólogos, terapeutas, advogados e outros profissionais.
O evento gratuito promovido pelo Centro de Estudos Holiste, foi aberto com uma palestra do médico psiquiatra, Luiz Fernando Pedroso, diretor clínico da Holiste sobre Radicalismo Político e Transtorno Mental. Ele abordou a questão do suicídio como manifestação política, alertando para a subestimação do transtorno mental nos casos de fanatismo. “O suicídio como manifestação política não é um fenômeno novo”, afirmou o psiquiatra, lembrando o caso o monge budista Mahayana Thich Quang Duc, que em junho de 1963, durante uma manifestação na cidade de Saigon, contra a política religiosa do governo do Vietnã, ateou fogo ao próprio corpo. “Atentados suicidas são exemplos da omissão com a saúde mental. Segundo a Organização Mundial da Saúde, o Brasil é o oitavo país em números absolutos de suicídios, com quase 12 mil casos registrados em 2012. Apesar de cada vez mais discutida, a doença mental ainda é muito subestimada”, declara Pedroso.
O convidado da noite, Demétrio Magnoli falou em seguida apresentando exemplos de organizações terroristas surgidas desde 1881, como a russa Narodnaya Volya (Vontade do Povo), que assassinou o czar Alexandre II. Também citou movimentos mais recentes como Exército Republicano Irlandês (IRA), o grupo separatista basco ETA (Espanha) e Sendero Luminoso (Peru). Ele esclareceu, ainda, a diferença de Fundamentalismo Islâmico; Fundamentalismo e Terror Tradicional, praticado por exemplo, por grupos como o Hamas e a Jihad Islâmica; e o Jihadismo Global, que é adotado pela Al Qaeda e pelo Estado Islâmico.
“O fundamentalismo islâmico é a ideia de que a sociedade deve ser governada de acordo com o Corão, segundo o islã original do tempo de Maomé. O fundamentalismo islâmico não necessariamente gera terrorismo”, explicou o colunista do jornal Folha de São Paulo e comentarista de políticas internacionais do canal Globo News. Magnoli ressaltou também que existem inúmeros partidos fundamentalistas islâmicos que não são terroristas. “As organizações terroristas ligadas ao fundamentalismo islâmico não são organizações do terror global, como o Hamas e a Jihad Islâmica, que atuam somente na Palestina. Já o Jihadismo global busca a restituição do califado, que é o império islâmico”, pontuou.
Graduado em Ciências Sociais pela Universidade de São Paulo (USP), Demétrio Magnoli explicou que “o lobo solitário”, aquele terrorista que age sem o amparo de uma organização por trás, não é tão solitário assim. “Existe uma família, uma mesquita, amigos no contexto desse terrorista”, afirmou, citando como exemplo o caso de Omar Saddiqui Mateen, atirador responsável pelo massacre na boate Pulse em junho desse ano em Orlando, na Flórida.
Palestras
O Ciclo de Palestras Holiste já realizou nos meses de julho e setembro desse ano palestras com o filósofo Luiz Felipe Pondé (Os desafios da Mudança); o psiquiatra Luiz Fernando Pedroso (Psiquiatria para Além da Medicina); a pesquisadora e sexóloga Carmita Abdo (Comportamento Sexual) e a médica psiquiatra Fabiana Nery (Sofrer por amor: Qual o limite?). A quarta edição do Ciclo de Palestras Holiste está prevista para acontecer em janeiro de 2017. Os interessados podem acompanhar a programação no site: www.holiste.com.br/palestras.