Pesquisar por:
Escritor Marcus Borgón lança o livro "O que sobrou do mundo", em Salvador
Escritor Marcus Borgón lança o livro “O que sobrou do mundo”, em Salvador

O escritor carioca, mas radicado na Bahia, Marcus Borgón lança o livro de crônicas O que sobrou do mundo, em Salvador. Em 28 crônicas permeadas de ironia, humor ácido e boa dose de ceticismo, o escritor aborda temas como o fracasso, a infância e a feiúra, permitindo-se rir de si mesmo e das pequenas desventuras cotidianas que a maior parte das pessoas enfrenta, fazendo com que o leitor se reconheça entre suas linhas. O lançamento acontece no sábado (dia 15), a partir das 15h, na Blá! Blá! Blá! Arte e Cultura, novo espaço cultural recém-inaugurado no Rio Vermelho, na capital baiana.

Este é o segundo livro que o autor da novela O Pênalti Perdido (P55 edições, 2016) apresenta, além dos textos publicados em revistas literárias e coletâneas de contos. “Ele não vem como militante, armado ou enfático, vestido a caráter para o confronto retórico. Ao contrário, chega quase como um anacoreta, tomando refrigerante ruim e acompanhado de cachorros que nem sabem fazer serviço de cachorro, e da escória de um bairro popular. Parece que não tem grandes pretensões, mas esse é justamente um dos diferenciais desta obra”, afirma o jornalista e escritor Franklin Carvalho, no texto da orelha.

A matéria-prima das 28 crônicas se alterna entre a evocação das memórias de infância, e as observações de quem vê a vida passar diante dos olhos sem forças ou desejo para interferir em seu curso. Há diversas situações nos textos de Borgón que farão com que o leitor se reconheça ou reconheça alguém conhecido. O autor demonstra um olhar irônico ao retratar o cotidiano, extraindo dele humor e lirismo, tal como faz ao retratar entrevistas de emprego fracassadas ou, ainda, se colocando na pele de personagens donos de pequenas sortes, ganhadores de brindes de pouco valor.

Ao tratar da feiúra, por exemplo, mostra uma tranquilidade desconcertante ao se comparar a um sapo: “O veneno sob a pele rugosa não assusta ninguém. Sua aparência, sim. Calafrios”. Músicas, mitos e contos de fadas se entrelaçam nos interesses que tecem o livro. Com linguagem irreverente, inteligência e humor ácido, Marcus Borgón leva o leitor a descobrir nestas crônicas o quão risível é nosso mundo de paixões violentas e ambições desmesuradas. Ao fim de suas páginas, a sensação que fica é de ser a amizade nosso bem mais valioso. E nele certamente o leitor encontrará O que sobrou do mundo.

Serviço:

O quê: Lançamento do livro de crônicas O que sobrou do mundo, de Marcus Borgón

Quando: sábado (dia 15), às 15h 

Onde: Blá! Blá! Blá! Arte e Cultura (Rua do Meio, 141, Rio Vermelho, Salvador – BA)

Quanto: o livro custa R$ 45 [140 páginas]

Escritor Marcus Borgón lança o livro "O que sobrou do mundo", em Salvador
Capa do livro de crônicas “O que sobrou do mundo”, de Marcus Borgón – Fotos: Fernando Lopes
Projeto Substantivo Luto - Foto: Priscila Fulô
Crônicas e fotografias abordam a dor da perda no livro Substantivo Luto

Sem medo de tocar em temas delicados, as jornalistas Mônica Santana e Ana Fernanda Souza produziram uma série de crônicas a partir da própria vivência do luto entre 2020 e 2021. Também vivendo sua perda familiar, a fotógrafa Priscila Fulô registrou o cotidiano com a ausência de sua mãe. Dessa experiência de tornar comum aquilo que parece muito pessoal, as autoras criaram o projeto Substantivo Luto – Criações para recriar, que lança um e-book, reunindo as crônicas e fotografias e o site, onde o livro pode ser baixado gratuitamente.

Amigas de longa data, as criadoras perderam suas mães num espaço próximo de tempo, em meio a pandemia. Segundo Mônica Santana, Substantivo Luto nasce como uma necessidade de olhar para a experiência da perda não para ser superada, para ser esquecida, mas para ser lembrada e lida como um ponto de passagem das nossas vidas, especialmente num momento como esse. “Atravessamos uma parte dos nossos lutos, produzindo textos e imagens, fazendo do ato criativo um exercício de recriar a nós mesmas e acreditar que a arte sana dores” afirma a jornalista e dramaturga. 

“Escrever sempre foi uma forma de me entender, fui daquelas crianças e adolescentes que tinha diário. A própria escolha da profissão, jornalismo, foi feita pelo desejo de escrever. Não foi fácil escrever a respeito de um processo tão doloroso como o luto mas, ao mesmo tempo, foi mais do que necessário para lidar com tudo o que estava acontecendo”, revela Ana Fernanda Souza.

Criações para Recriar

As fotografias de Priscila Fulô descortinam os dias de ausência de sua mãe, o novo cotidiano de desfazer de objetos e espaços que eram preenchidos de sua presença, com um olhar sensível e melancólico. Segundo a fotógrafa, “a intenção era produzir imagens que trouxessem de forma íntima o luto, mas também os sentimentos novos, dúvidas simples sobre quantos pães comprar agora que minha mãe não está mais aqui? As fotografias mostram a passagem de tempo e trazem essas reflexões sobre como seguir, o que  fazer e a busca de novo sentido a partir da perda”.

O escritor e poeta Alex Simões assina o prefácio do e-book e afirma que “Ana Fernanda e Mônica nos lembram da importância dos ritos”. A primeira nos relata dois lutos, como filha, como amiga-sócia, e sendo mãe do neto que conviveu intensamente com a avó em seu final de primeira infância. A segunda nos apresenta o luto de filha que remete aos lutos da sobrinha e neta, na partilha da dor com sua irmã, Priscila Fulô, que assina os registros fotográficos presentes neste livro. As escritoras retornam às casas de suas mães/de suas infâncias no processo de cuidar (um tema tão importante e para o qual nós, sobretudo os homens, não somos e muitas vezes nem queremos ser preparados), e depois para viver e conviver com os espaços físicos repletos de memórias nada abstratas”.

Substantivo Luto será lançado pela Andarilha Edições e contou com a produção de Fabiana Marques, pela Árvore Produtora. O projeto tem apoio financeiro do Estado da Bahia através da Secretaria de Cultura e da Fundação Cultural do Estado da Bahia (Programa Aldir Blanc Bahia) via Lei Aldir Blanc, direcionada pela Secretaria Especial da Cultural do Ministério do Turismo, Governo Federal. 

Booktrailer do livro
O chato da turma
O chato da turma

É sempre assim. Entra ano e sai ano. Não importa se no ginásio, 2° grau, na faculdade ou no trabalho. Ele estará lá, ao seu lado. O odiado “colega chato”. Aquela “mala sem alças”, que critica todos a sua volta. Para ele, tudo o que você faz não está bom, mesmo que não consiga fazer melhor. O trabalho sempre estará faltando algo, sua apresentação não será suficientemente explicativa na opinião dele ou você não penteia o cabelo do jeito que ele acha que ficará melhor. É ele que fica ao seu lado, quando você está dirigindo, te dizendo qual o melhor caminho a seguir, mesmo que você já conheça o trajeto décor.

Não lembro o ano em que não tive que conviver com alguém assim, seja homem ou mulher. Na verdade, mulheres são naturalmente mais chatas do que os homens. Deve ser pelo fato dos hormônios se revoltarem com elas uma vez por mês.

O chato sempre se fantasia de melhor amigo e quando indagado o porquê de tantas criticas a seu respeito, sorridente e com a cara de pau, típica de quem só usa no rosto como “hidratante” óleo de peroba, diz que “são criticas construtivas!”. Construir é uma coisa, demolir é outra completamente diferente. Se bem que o engenheiro do Palace II, no Rio não sabe a diferença até hoje.

Existem várias formas de se falar algo que lhe incomoda em um amigo ou colega. Procure sempre analisar para ver como a pessoa receberá a crítica, se ela tem fundamento e se afeta outras pessoas. Porque, se você for o único atingido, como diz o dito popular “incomodados que se mudem”. E se depois dessas dicas o relacionamento com o seu (sua) colega chato(a) não melhorar reflita se não é você que está envelhecendo e ficando chato.

*Texto de Rafael Veloso, publicado originalmente no Guia Semanal de Ideias, do Caderno Dez!, do jornal A Tarde, em 4 de setembro de 2003.

Caderno Dez! - Jornal A Tarde 20/02/2003
A sobrinha-neta querida

Por Rafael Veloso*

Foi um período difícil para a família de Astolfo Albuquerque, proprietário da mais antiga fabrica de cortinas da Bahia. Pai pouco dedicado, “Seu Astolfo”, como era conhecido só pensava em ganhar cada vez mais dinheiro. Aliás, esse era o seu único prazer na vida. Nem o casamento de 53 anos com D. Amália, nem o nascimento de seus cinco filhos – três homens e duas mulheres, nem mesmo o nascimento de seu primeiro bisneto, foram mais importante do que a conquista de sua fortuna.

Seu Astolfo, se encontrava internado há 15 dias, no melhor hospital da cidade. Mas nem os melhores médicos e os tratamentos mais modernos adiantaram contra a ferocidade do câncer de próstata, que o vitimou. Um ano e meio lutando contra a doença e no sábado, em pleno carnaval, o velho resolve morrer. No velório concorrido, muitos empresários, políticos, funcionários e familiares prestando a última homenagem.

As filhas e a viúva enxugavam, com seus lenços franceses, as poucas lágrimas encobertas pelos óculos escuros. Diziam as más línguas que elas estavam tranquilas e inabaláveis, como se nem sentisse a morte do patriarca da família. Eis que adentra a sala onde estava sendo realizado o velório, a sobrinha-neta de Astolfo. Ciente da riqueza de seu tio-avó, a quem só vira uma única vez, como um furacão, começa sua dramatização. Aos prantos se atira sobre o caixão de alças banhadas à ouro.

– Oh vida cruel! Oh Deus, que castigo! Meu titio querido, tão novo – sendo interrompida por um dos filhos do defunto, que curioso para saber de quem se travará aquela figura, trajando um vestido longo prata brilhante e um arranjo de cabelo em forma de pavão, como se estivesse pronta para algum baile de carnaval, disse:

– Ele completaria 88 anos. Ela desconsertada, respondeu dizendo “que para Deus todos nós somos apenas criancinhas.”

– Desculpe, mas quem é a senhora? Era a pergunta que todos se faziam.

– Senhorita, por favor. Sou Ana Letícia Cristina de Albuquerque Alvarenga, a sobrinha-neta preferida do titio “Astó”.

– E única – retrucou o filho do morto, –  já  que a prima Elidia, sua mãe, só tem você.

E nesse pequeno tumulto, ouve-se um celular desesperadamente a tocar. E todo o ambiente que permanecia atônito com a chegada da sobrinha-neta, ficou chocado com o conteúdo da conversa.

– Oi Claudinha, querida, estou enterrando meu titio amado. Ah, mais claro! Claro que vou ver o Chiclete passar amanhã. E você acha que eu sou louca de perder essa oportunidade de ver o “Marquinhos”, o “Paulinho”, “Serginho”, “Eduardo Augusto”, o “Evandro Carlos”, todos os melhores partidos de Salvador. Só vai dar eu!!!

Caderno Dez! - Jornal A Tarde 20/02/2003
*Rafael Veloso é estudante do 1° Semestre de Jornalismo da FIB (Faculdade Integrada da Bahia). Texto originalmente publicado pelo Caderno Dez!, do jornal A Tarde, em 20 de fevereiro de 2003.